quarta-feira, 23 de dezembro de 2009





Entrevista


" - Você é escritor?
- Sou.
- Como se chama?
- Charles Bukowski.
- Sobre o que escreve?
- Oh, deus não sei. Por pior que isso soe: a Vida... acho.
- Não soa mal. Isso inclui sexo?
- A vida não inclui?
- As vezes. As vezes, não. O que acha do trabalho de escritor?
- Bom, é melhor do que lavar pratos.
- O que acha dos escritores?
- Os escritores são prostitutas. Os escritores são as prostitutas do universo.
- Já foi publicado?
- Já.
- Já leu Pirandello?
- Já.
- Já leu Swinburne?
- Todo mundo leu.
- Já leu Herman Hesse?
- Já, mas não sou homossexual.
- Você odeia homossexuais?
- Não, mas também não adoro.
- E os negros?
- Que é que tem os negros?
- Que acha deles?
- São legais.
- Tem preconceito?
- Todo mundo tem.
- Que conselho dá aos jovens escritores?
- Bebam, fodam e fumem cigarros.
- E para os velhos escritores?
- Se o cara continua vivo, não precisa de meus conselhos.
- Qual o impulso que faz você criar um poema?
- O mesmo que faz você dar uma cagada.
- Leu os jornais hoje?
- Li.
- Leu sobre as cinquenta meninas que morreram queimadas naquele orfanato de Boston?
- Li
- Não foi horrível?
- Acho que foi.
- Você acha que foi?
- É.
- Não sabe?
- Se eu estivesse lá, acho que teria pesadelos o resto da vida. Mas é diferente quando a gente apenas lê sobre as coisas no jornais.
- Não sente pena das cinquenta meninas que morreram queimadas? Elas se penduravam das janelas gritando.
- Acho que foi horrível. Mas a gente vê isso apenas como uma manchete de jornal, uma matéria de jornal. Na verdade não pensei muito nisso. Virei a página.
- Que dizer que não sentiu nada?
- Na verdade, não.
- Que acha de Reagan e do desemprego?
- Eu não penso em Reagan ou no desemprego. Tudo isso me enche o saco. Como os vôos espaciais e o campeonato de beisebol.
- Não gosta dos Dodgers?
- Não.
- De que é que gosta então?
- Boxe. Tourada.
- Tourada é cruel.
- É, tudo é cruel quando a gente perde.
- Mas o touro não tem nenhuma chance.
- Nenhum de nós tem.
- O que acha da crise do país?
- Sabe estou cagando se o país está na merda ou não, contanto que eu me vire.
- Que é que você acha da guerra?
- Não tem nada de errado com a guerra
- Ah é, é ?
- É. Quando você entra num táxi, isso é guerra. Quando você compra uma puta, é guerra. Quando você compra um pão é guerra. Às vezes eu preciso de pão, táxi e puta.
- Você gosta de guerra?
- Não tem nada de errado com ela: é uma extensão natural de nossa sociedade.
- Sabe, os outros não tem de aceitar essa merda.
- Os outros aceitam o que têm de aceitar. Aceitam coisa muito pior.
- Quais são as suas preocupações, então?
- As mulheres modernas.
- As mulheres modernas?
- Elas não sabem se vestir. Usam uns sapatos pavorosos.
- Que acha da Liberação das Mulheres?
- Na hora que elas estiverem dispostas a lavar carros, se pôr atrás de um arado, perseguir os dois caras que acabaram de assaltar a loja de bebidas ou limpar os esgotos, na hora que estiverem dispostas a ter os seios arrancados á bala no exército, eu estou disposto a ficar em casa e lavar os pratos e me chatear catando fiapos do tapete.
- Que pensa do amor?
- Não penso.
- O que mais pode ser o amor? Defina.
- O senso comum de querer muito alguma coisa muito boa. Não precisa estar relacionado por laços de sangue. Pode ser uma bola de praia vermelha ou uma fatia de torrada com manteiga.
- Você está querendo dizer que você pode amar uma fatia de torrada com manteiga?
- Somente algumas. Em determinadas manhãs. Sob determinados raios de sol. O amor chega e vai embora sem avisar.
- É possível amar um ser humano?
- É claro, especialmente se você não os conhecer muito bem. Eu gosto de olhar para eles através da minha janela, caminhando na rua.
- Você é bom de cama?
- A maioria dos homens gosta de pensar que é. Provavelmente sou bom, mas não sensacional.
- Chupa xoxota?
- Chupo.
- Você baixa mesmo a boca nas mulheres?
- Diabos, sim. Mas todo mundo faz isso hoje. Estamos em 1982, eu tenho 62 anos. Você pode arranjar um homem trinta anos mais novo e ele faz a mesma coisa. Provavelmente melhor.
- Acredita que o homem é o senhor do universo?
- O homem é a cloaca do universo.
- O sentido da vida. Eu quero saber por que temos vivido todos esses anos? Será que desperdiçamos nossas vidas?
- Todo mundo desperdiça, quase todo mundo desperdiça
- O que podemos fazer então?
- Comer, dormir, foder, mijar, se vestir, andar por aí e encher o saco dos outros.
- O que eu preciso saber é se há uma saída. Há alguma espécie de saída?
- Garoto, não há saída. Os analistas aconselham a gente a jogar xadrez ou colecionar selos ou jogar bilhar. Qualquer coisa, menos pensar nos problemas maiores.
- Xadrez é um saco.
- Tudo é um saco. Não há como escapar. Sabe que alguns vagabundos de antigamente tatuavam no braço: "NASCIDO PARA MORRER". Por mais primitivo que pareça isso, é sabedoria fundamental.
- Que acha que os vagabundos tatuariam no braço hoje?
- Não sei. Na certa alguma coisa do tipo: "JESUS SHAVES (Jesus Barbeia) "
- Pra onde que a gente vai quando morre?
- Ah, merda. Não tô nem aí.
- Não acredita no Espírito Humano?
- Pura lorota, uma merda!
- Você é negativo pra caralho. Acredita em Deus?
- Não no seu tipo de deus.
- Que tipo?
- Não sei ao certo.
- Eu vou à igreja desde que me lembro. Que acha que é Deus?
- Cabelo branco, barba comprida e sem pau.
- Não podemos fugir de Deus, podemos?
- Talvez ELE não possa fugir de nós.
- Você bebe?
- Não só bebo como vivo sempre de porre.
- Por que você bebe tanto?
- Diabos, não sei. Acho que o principal é que simplesmente fico de saco cheio.
- Você fica sentado aí, com seu roupão rasgado, e passa metade do tempo bêbado, mas eu sei que é mais são do que qualquer um que eu conheço.
- Opa gosto disso. Você conhece muita gente?
- Não. Você é um filho da puta, mas a gente pode falar com você. Os outros poetas estão sempre exibindo as plumagens e fazendo um número burro de babaca. Você não parece um escritor.
- Dou graças por isso."

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