terça-feira, 23 de março de 2010





Crise Existencial


"O velho Sánchez é um gênio, mas o único que sabe disso sou eu, e é sempre um prazer visitá-lo. São raríssimas as pessoas com quem aguento ficar mais de 5 minutos sem me chatear. Sánchez já foi aprovado no teste. Seja lá como for, de vez em quando vou visitá-lo naquele sobrado, construído à mão, onde ele instalou seu próprio encanamento, tem luz elétrica tirada de uma linha de alta voltagem, ligou o telefone por fio subterrâneo ao número do vizinho, mas já me explicou que não pode fazer nenhum interurbano ou para fora dos limites da cidade sob pena de revelar sua condição de parasita.

– Estou achando que não valho pra nada – digo-lhe – 11 anos no mesmo trabalho, as horas se arrastando feito bosta mole, e a cara de todo mundo se reduzindo a uma massa disforme, matraqueando, rindo sem motivo nenhum. não sou esnobe, Sánchez, mas às vezes a coisa fica um verdadeiro show de terror e a única saída é a morte ou a loucura.

– A sanidade mental é uma imperfeição – sentencia, botando 2 comprimidos na boca. 

– Pô, o que eu quero dizer é que estudam minha obra em várias universidades, tem um professor aí escrevendo um livro sobre mim... já me traduziram para uma porção de línguas... 

– Todos nós passamos por isso. você está ficando velho, Bukowski, tá se deixando levar. Não entrega a rapadura. Vitória ou Morte! 

- Estou com um coisa em andamento - explico, - uma história em que eu entro pra entrevistar um grande compositor. Ele tá de pileque, eu também fico. Tem uma criada. Estamos tomando vinho. Ele se inclina pra frente e diz "Os Humildes Herdarão a Terra"... 

- Ah é ? 

- E aí ele acrescenta:" isso, traduzindo em miúdos, significa que os burros tem mais persistência". 

- Meio fraco - Sanchez comenta, - mas pra você até que não está ruim. 

- Só que não sei o que fazer com a história. Tem essa tal criada, andando pra lá e pra cá, com uma coisinha bem curta, e não sei o que fazer com ela. O compositor fica de porre, eu também e ela pra lá e pra cá, exibindo o rabo. Um tesão de deixar qualquer diabo doido, e não sei o que fazer com tudo isso. Pensei que desse pra salvar a história batendo com a fivela do meu cinto na criada e depois chupando a pica do compositor, mas nunca chupei pica, nunca senti vontade, sou careta, por isso deixei a história pela metade e não terminei. 

- Todo homem é entendido e gosta de chupar pica; toda mulher é sapatão. Por que se preocupa tanto com isso? 

- Porque se não me sinto feliz, não sirvo pra nada e eu quero servir pra alguma coisa."


Um comentário: